A Demarcação dos Limites da Coisa Julgada pelo STF

                 A coisa julgada encontra-se positivada no Código de Processo Civil no artigo 502, possuindo o mesmo a seguinte redação: “Denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso”.

                  A força coisa julgada, resta plenamente quantificada quando voltamos atenção à Constituição Federal, uma vez que a mesma constitui cláusula pétrea, estando descrita no art. 5, inciso XXXVI da CF/88: “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.

                  Da leitura desses dois dispositivos legais torna-se perceptível que o instituto da coisa julgada foi criado com a função precípua de proporcionar definitividade à função jurisdicional.

                  Ocorre que essa definitividade pode estar ameaçada, pelo menos no que tange às matérias de ordem tributária.

                  Tudo teve início com o STF ter reconhecido no ano de 2016 a repercussão geral dos Recursos Extraordinários de nº 955.227 e 949.297, cujo mérito de ambos versa sobre o limite da coisa julgada em âmbito tributário, na hipótese de o contribuinte ter em seu favor decisão judicial transitada em julgado que declara a inexistência de relação jurídico-tributária, ao fundamento de inconstitucionalidade incidental de tributo, por sua vez declarado constitucional, em momento posterior.

                  De maneira sucinta, os Recorrentes alegam que são beneficiários de decisão transitada em julgado, tendo sido reconhecida a inconstitucionalidade da cobrança da CSLL, instituída pela Lei 7.689/88, uma vez que o referido diploma legal não foi precedido de Lei complementar.

                  Ocorre que, de modo superveniente, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por unanimidade, declarou a constitucionalidade da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), tal como prevista na Lei 7.689/88, no bojo da ADI 15, de relatoria do Ministro Sepúlveda Pertence. Tal fato, fez com que a União passasse a cobrar o referido tributo, de contribuintes que já haviam deixado de recolhe-lo em razão de decisões, conforme acima explicado, que haviam reconhecido a ilegalidade da referida cobrança.

                  Irresignados, com o fato de passarem a ser autuados pela União, para realizar o pagamento da CSSL, os contribuintes protocolaram RESP de nº 1.118.893, tendo os mesmos obtido importante vitória, uma vez que, ao apreciar o mérito do recurso, os ministros firmaram entendimento sobre a ilegalidade da cobrança da CSLL, conforme trecho do acórdão abaixo transcrito.

“(…) o Supremo Tribunal Federal, reafirmando entendimento já adotado em processo de controle difuso, e encerrando uma discussão conduzida ao Poder Judiciário há longa data, manifestou-se, ao julgar ação direta de inconstitucionalidade, pela adequação da Lei 7.689/88, que instituiu a  CSLL, ao texto constitucional, à  exceção do disposto no art 8º, por ofensa ao princípio da irretroatividade das leis, e  no art. 9º, em razão da incompatibilidade com os arts. 195 da Constituição Federal e 56 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT (ADI 15/DF, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, DJ 31/8/07).3. O fato de o Supremo Tribunal Federal posteriormente manifestar-se em sentido oposto à decisão judicial transitada em julgado em nada pode alterar a relação jurídica estabilizada pela coisa julgada, sob pena de negar validade ao próprio controle difuso de constitucionalidade.4. Declarada a inexistência de relação jurídico-tributária entre o contribuinte e o fisco, mediante declaração de inconstitucionalidade da Lei 7.689/88, que instituiu a CSLL, afasta-se a possibilidade de sua cobrança com base nesse diploma legal, ainda não revogado ou modificado em sua essência”.

                  Ou seja, de um lado estão os contribuintes respaldados pelo trânsito em julgado de decisões proferidas no ano de 1992, reconhecendo a ilegalidade da cobrança da CSLL e do outro lado, está a Fazenda Nacional com o objetivo de relativizar o alcance da coisa julgada, com base no Parecer 492/2011 da PGFN, cujo texto dispõe: “(…) Os precedentes objetivos e definitivos do STF constituem circunstância jurídica nova, apta a fazer cessar, prospectivamente, eficácia vinculante das anteriores decisões tributárias transitadas em julgado que lhes forem contrárias (…) ”.

                      Uma posição é unânime entre as partes e demais contribuintes: caso o STF entenda por relativizar o poder da coisa julgada nos casos em que há alteração de jurisprudência de tributos de relação continuada, tal posição além de gerar abalo à segurança jurídica, também trará questionamentos, quanto a ação rescisória, uma vez que será possível reformar decisão transitada em julgada sem o ajuizamento desta e, por fim, poderá gerar a reforma de inúmeras decisões que hoje resguardam direitos adquiridos.

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